sexta-feira, 26 de março de 2010
Os Zé-Ninguém
Tradução livre do poema de Eduardo Galeano (Los Nadies)
«Sonham as pulgas comprar um cão
e sonham os zé-ninguém deixar de ser pobres.
Que algum dia mágico lhes traga a sorte,
que chova a cântaros a boa sorte.
Porém a boa sorte não choveu ontem,
nem choverá hoje, nem amanhã, nem nunca.
Nem a chuva cai do céu, nem a boa sorte,
por muito que os zé-ninguém por ela clamem.
Ainda que lhe acenem com a mão esquerda,
ou se levantem com o pé direito,
ou comecem o ano mudando de escova de dentes,
os zé-ninguém, os filhos de ninguém, os donos de nada.
Os zé-ninguém: os nenhuns, os não nomeados,
correndo como lebres, morrendo na vida
Fodidos e refodidos.
Aqueles que não são, ainda que sejam.
Que não falam idiomas, apenas dialectos.
Que não professam religiões, apenas superstições.
Que não fazem arte, só artesanato.
Que não fazem cultura, só folclore.
Que não são seres humanos, apenas recursos humanos.
Que não têm cara, só têm braços.
Que não têm nome, apenas um número.
Que não figuram na história universal,
só na crónica vermelha da imprensa local.
Os zé-ninguém que custam menos que a bala que os mata »
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